Os Masai são um grupo étnico africano de seminômades do Quênia e do norte da Tanzânia. Sempre vestidos de vermelho, esse povo se considera escolhido por Deus. Na história, são conhecidos como guerreiros destemidos e o chefe dos Masai é definido a partir de uma competição de salto: quem pular mais alto, vence. E esse conceito de voar longe foi o que inspirou o rapper Flávio Renegado em seu novo projeto: ‘Suíte Masai’. O álbum une rap e música clássica da Orquesta de Ouro Preto. “Costumo dizer que esse é o meu projeto musical de vaidade: fazer rap, que é uma música da periferia, e conseguir combinar com a música clássica. Essa é uma conquista para o movimento e para a música popular”, comemora ele. Com 15 faixas, o trabalho recria hits antigos, como ‘Do Oiapoque a Nova York’, ‘Conexão Alto Vera Cruz Havana’ e ‘Minha Tribo é o Mundo’, porém, orquestrados.
Porém, até chegar nesse ponto da carreira, Flávio Renegado percorreu um longo caminho. Mineiro da comunidade Alto Vera Cruz, zona leste de Belo Horizonte, cresceu escutando James Brown e muito soul, mas foi quando ouviu Racionais que a chave virou. “Quando cresci um pouco tive a possibilidade de conhecer outros tipos de música, ver outros shows, e aí veio uma paixão fulminante também pela Nação Zumbi, O Rappa e Planet Hemp…” Em 2008, nasceu o primeiro álbum ‘Do Oiapoque a Nova York’ e, desde então, ele nunca mais abandonou os palcos com as suas músicas que falam sobre o cotidiano e a realidade das favelas. “A periferia ama, a periferia chora, dança, canta… Isso tudo é combustível para estar na música”. Em turnê do álbum ‘Suíte Masai’, que passará por São Paulo e Rio de Janeiro, conheça mais sobre Flávio Renegado e sobre a cena rapper mineira!
Glamurama: Como você começou no rap?
Flávio Renegado: A música me abduziu quando eu era pré-adolescente. Na minha comunidade nós sempre tivemos uma fascinação muito grande por James Brown e foi um som que me puxou, tocava praticamente em todas as casas. Algum tempo depois comecei a fazer capoeira e, logo na sequência, ia às quermesses de rua e via o pessoal dançando ‘break’… ficava enlouquecido com aquilo. Aí quando ouvi Racionais pela primeira vez, virou a chave.
G: Além de James Brown, quais suas outras inspirações?
FR: Lembro que ouvíamos muito soul, então esse som foi a minha maior influência na infância. Quando cresci um pouco, tive a possibilidade de conhecer outros tipos de música, ver outros shows, e aí veio uma paixão fulminante também por Nação Zumbi, O Rappa e Planet Hemp.
G: Você é de BH. Como é a cena do rap em Minas?
FR: Hoje o duelo de MCs de BH é o maior do Brasil. A grande final dos duelos, inclusive, acontece lá. A cena do rap mineiro cresceu muito. Conseguimos construir um movimento muito forte. Isso me deixa muito feliz: o movimento, o momento.
G: Chegou a participar desses duelos?
FR: Freestyle nunca foi o meu forte. Venho de outra época, então sempre escrevi as minhas músicas. É outro tipo de construção.
G: Quando você decidiu seguir essa carreira?
FR: Sempre tive grupos de rap e, quando eu fiz 18 anos, já sabia que queria ser artista, mas em 2006 fiz o meu primeiro show solo e foi quando entendi que era possível viver isso. Depois desse show, veio meu primeiro álbum, em 2008, chamado ‘Do Oiapoque a Nova York’ e aí a minha vida virou de cabeça pra baixo, no bom sentido. Foram mais de 180 shows só com esse disco. Conheci a Europa, Austrália, Nova York, América Latina inteira… Mudou a vida.
G: Como é o processo criativo das letras? No que você se baseia?
FR: Acho que tudo me inspira. Gosto de falar do cotidiano, das coisas que acredito e das coisas que me indignam também. Também adoro falar sobre amor, porque a periferia toda é esse universo. A periferia ama, a periferia chora, dança, canta… Isso tudo é combustível para estar na música.
G: E como você analisa o cenário político atual em que a cultura e a música estão sendo deixados de lado?
FR: É lamentável. Estávamos em uma crescente muito bonita. Mesmo que aos poucos, começamos a nos encontrar como nação, o acesso chegava aonde tinha que chegar. E, de repente… entramos em uma era de retrocesso. Como se só saber fritar hambúrguer resolvesse a vida das pessoas.
G: Quais rappers atuais você indica?
FR: Tenho escutado muitas coisas novas que têm me trazido referências muito legais. Nessa nova onda de rap nacional o Djonga, pra mim, é um dos melhores. Tem o FBC também, que é um grupo mineiro muito legal.
G: O que é o rap para você?
FR: O rap é resistência. É mostrar para as outras pessoas que nós podemos. E o rap de vanguarda fez muito isso, ajudou a construir a autoestima dessa nova geração. Nós pavimentamos a rua nos anos 90 e agora eles desfilam mostrando o que é necessário.
G: Você tem um projeto que envolve música clássica e arte. Como é isso?
FR: Gravei em agosto de 2018, junto com a Orquestra Ouro Preto, o CD ‘Suíte Masai’, na Comunidade Alto Vera Cruz. Fizemos esse encontro da música clássica com o rap e o concerto foi maravilhoso. Agora começamos a turnê em Ouro Preto, depois Belo Horizonte e estamos trazendo o show para São Paulo e Rio de Janeiro também. O nosso objetivo é o mundo! (por Jaquelini Cornachioni)