Divas doidas, doidas divas: as estrelas que tinham os nervos à flor da pele

Voluntariosas, donas de egos enormes, essas estrelas marcaram época com os nervos na montanha-russa. Tempestivas, seus humores pipocavam mais que os flashes que recebiam no tapete vermelho

Por Renato Fernandes para a Revista J.P de Agosto

Ava Gardner

Ava Gardner

Diva Clássica

Em setembro de 1954, desembarca no Rio de Janeiro a estrela Ava Gardner, tida como “o animal mais belo do mundo” no universo cinematográfico. Era sem dúvida belíssima, mas seu temperamento selvagem marcou tanto quanto sua beleza. Ao se hospedar no Hotel Glória, um dos mais sofisticados da cidade, Ava simplesmente não gostou. O que ela fez? Teve um ataque de fúria, quebrou os móveis da suíte e ainda jogou os objetos de decoração pela janela.

Diva histérica, ela achava que o hotel não estava à altura de sua fama e de seu egocentrismo exacerbado. Drinques, adorava – demais. Homens também: seu casamento – e brigas – com Frank Sinatra era sempre assunto nos tabloides americanos. Famosa, ela o ajudou muito financeiramente numa fase difícil da carreira dele. Ao Brasil já chegou separada e, durante a coletiva de imprensa com jornalistas, deixava avisado que não iria falar de Frank, só do filme que estava divulgando, A Condessa Descalça. Tanto fez que fez, que saiu do Hotel Glória e foi se hospedar no Copacabana Palace, que achava ser mais digno de sua divindade.

Sexo gostava, e muito, e era conhecida por seu apetite e aventuras sexuais. Diz a lenda que nosso colunista Ibrahim Sued foi seu prato preferido em terras cariocas. Mas ele não foi suficiente para saciar a diva, que adiantou sua passagem em três dias e nem chegou a abrir suas 16 malas Louis Vuitton. Voltou.

Nunca conseguiu realizar seu maior sonho: ser mãe. “O que eu queria dizer sobre o estrelato é que ele me deu tudo o que eu nunca quis”, dizia ela. A bebida e o cigarro foram companheiros de vida. Sempre declarava que queria morrer com um cigarro na mão e um uísque na outra. E não envelheceu bem: “Chega uma hora que você encara o fato de que virou uma puta velha”. Passou o último ano de vida isolada em seu apartamento em Londres. Faleceu aos 67 anos, no dia 25 de janeiro de 1990. Quem pagou as contas do hospital foi seu ex- marido, Frank Sinatra, aquele da qual ela não gostava nem de falar.

Maria Callas

Maria Callas

Master Diva

“Gostaria de ser Maria, mas é La Callas que exige que eu a porte com dignidade”, dizia Maria Callas, uma das mais temperamentais de todas as divas da ópera, sem dúvida. Da amizade com o cineasta Luchino Visconti, ganhou o apelido de  La Divina e vestiu com maestria o título. Quando ouvia o nome de sua principal concorrente, a soprano Renata Tebaldi, ficava possessa. Outro assunto que a atormentava era seu peso e, conforme seu divino e inconstante humor, ela emagrecia e engordava 20 ou mais quilos numa tacada só. Fazia dieta durante o dia e, à noite, atacava a geladeira. Os controladores de apetite também ajudavam para seus nervos na montanha-russa.

Maria Callas era disputada por grandes maestros e diretores e cantou nos maiores teatros do mundo, como o Metropolitan de Nova York, cidade onde nasceu. Para o Brasil, veio em 1951 para cantar no Theatro Municipal de São Paulo e do Rio de Janeiro. Ao chegar, descobriu que quem estava fazendo uma temporada de shows por aqui era Renata. Consta no livro Divas Abandonadas, de Teté Ribeiro, que Callas ficou furiosa quando se viu numa mesma festa em que a outra estava, e chegou a falar para a concorrente parar de cantar, pois ela cansava o público.

Uma coisa é fato: Maria Callas era superprofissional, pontual e ensaiava à exaustão. Nenhuma soprano gravou e vendeu tanto quanto ela, que reinou absoluta na década de 1950. Além de tudo, tinha estilo e ditava moda: Dior e Givenchy enviavam roupas de presente para que ela usasse e fosse fotografada. Callas também se amarrava em um modelo Balmain. Abusava de óculos grossos escuros, pois tinha uma miopia forte. Dona de um grande nariz, disfarçava o tamanho com maquiagem, passando um forte rímel e delineador estilo gatinho. Foi até copiada.

Frequentava o jet set e quando conheceu o armador grego Aristóteles Onassis, que sabia muito bem da grandiosidade da diva, a paixão foi avassaladora. Muitas noites a bordo do Christina – até então o iate mais caro do mundo. Dele lógico. Ela estava em uma fase magra e abusou do biquíni e de óculos escuros em alto-mar. Para alguns, amar foi sua ruína, a maior tragédia de sua vida. Estilo “Tosca”, música eternizada por sua voz. Ficou grávida e existem algumas versões sobre o filho. Onasssis a teria feito abortar. Consta que quando ela chegou a seu apartamento, depois da intervenção, estava deprimidíssima e encontrou a sala repleta de rosas vermelhas e um colar de pérolas com diamantes. Mas também dizem que teria perdido o bebê naturalmente e até mesmo que o filho chegara a nascer, mas que morreu logo depois. O fato é que ela e Onassis ficaram juntos por três anos.

Temperamental, canalizou tudo isso e na década de 1960 já não entoava como antes. Porém, nada que não a impedisse de colocar um oficial de justiça para correr, aos berros, quando foi intimada dentro de um teatro. Em 1965, abandonou os palcos, muito por conta de seu estilo passional e desequilíbrio emocional. O amor pelo magnata grego acabou com ela. Dona de uma enorme juba, se recolheu em seu apartamento em Paris e morreu em 1977, sozinha, como uma boa diva requer.

Sandra Brea

Sandra Bréa

Diva Brasileira

Superstar até dizer chega, a atriz Sandra Bréa reinou na televisão nos anos 1970.  Foi eleita pela revista Status, a mulher do ano, em 1977. E em seguida, surgiu nua em um ensaio de 12 páginas. Segura a diva!

Ela também apareceu despida completamente na sacada de um hotel em Tramandaí, no litoral do Rio Grande do Sul, às 4h30 da manhã, após a apresentação de um show que fazia em dupla com Miele. Discutiu com os populares que estavam na rua e, se não bastasse, surge seu companheiro de então, Marcelo Barreto, gato, filho do galã Carlos Alberto, peladão na sacada. Completamente alterada, chegou a descer – já vestida – para o saguão e atirou um bule contra o grupo de pessoas.

Em maio do mesmo ano, discutiu com funcionários do aeroporto de Porto Velho, pois queria levar com ela porquinhos do mato, araras e galinhas-da-guiné, sem autorização das autoridades ambientais, para sua casa em Jacarepaguá. Não conseguiu e consta que quase apedrejou o avião.

Até o início da década de 1980, Sandra emendava novela com novela, marido com marido. Em 1981, estava casada com o fotógrafo Antonio Guerreiro. O relacionamento durou menos de dois anos, mas ficaram as fotos: Guerreiro fez centenas e ela voltou a ser a mulher do ano, agora pela Playboy. Uma das razões do fim da união foi o hábito da atriz de tomar Halcion. Três meses depois de separada, ela já estava noiva do empresário Arthur Guarisse, com quem se casou, de véu  grinalda, em maio de 1983. Duração do matrimônio: menos de quatro meses.

Intensa, Sandra vivia no palco 24 horas – ou quase: também amava ficar em casa ao lado de seus animais, horta e galinheiro. Ali, encontrava paz. Sempre acompanhada por quatro maços de cigarro por dia. Não era raro acordar com a roupa de cama queimando, já que dormia com o cigarro na mão. No fim de 1980, já não encabeçava o elenco das novelas, surgindo sempre como “participação especial”. Em 1987, mais um escândalo: recebeu um motorista de táxi a tiros pelo fato de ele atrasar a entrega dos remédios que pedira.

Gostava de dar coletivas. Fez uma ao se separar do primeiro marido, Eduardo Espínolla, em 1975, e outra em 1993, quando convocou jornalistas para assumir com extrema coragem que era vítima do vírus do HIV. Deu a cara e sofreu críticas e preconceitos de montão. Tinha uma relação confusa com a imprensa: durante as coletivas, atrasava e, quando a procuravam, atendia o telefone disfarçando a voz dizendo que não era ela.

Um clássico das atrizes da década de 1970 da Rede Globo até hoje, Sandra Bréa faleceu reclusa, em sua residência, vítima de câncer no pulmão, aos 47 anos, em maio de 2000.

Sylvia Kristel

Sylvia Kristel

Diva Erótica

Em 1977, aterrissa no Brasil a atriz holandesa Sylvia Kristel, mais conhecida como Emmanuelle, personagem da série de filmes eróticos que a fez ficar famosa em todo o mundo. Emmanuelle não perdoava homens ou mulheres: o sexo era sua fonte de prazer. Suas cenas dentro de um avião tornaram-se antológicas. Porém Sylvia não fez por menos, aprontou por aqui. Veio para divulgar o filme La Marge, em que atuava com Joe Dallesandro, e, na coletiva, depois de três perguntas, deu por encerrada. Além de cansada, dizia que estava para divulgar o filme e não se defender.  Exausta ou não, não parava quieta, e chamou atenção por sua magreza: 45 quilos. No cocktail do evento em São Paulo, no bar e restaurante L’Absinthe,  foi abordada por um fã adolescente que queria seu autógrafo na capa de uma revista. Não se sentiu nada prestigiada, queria era a revista para ela e nada mais. Não deu.

No Brasil, chegou a participar da novela Espelho Mágico e ilustrar capas de revistas, sempre com uma companhia: o álcool. Quando foi ser maquiada para uma das fotos, mal conseguia se equilibrar de tanto que bebeu. Em 1982, ela retorna ao país, agora para divulgar o filme O Amante de Lady Chatterley, que tinha cenas de erotismo um pouco mais suaves. Mas era sempre questionada sobre a série de longas de Emmanuelle. Chegou a declarar à revista Amiga: “Me senti horrivelmente  mal. Eu me forçava naquelas cenas de sexo e nunca consegui imaginar que o filme faria tanto sucesso”.

Fez, e durante toda a vida de Sylvia, carregou o carma de deusa do sexo, mesmo nunca tendo feito nenhuma cena explícita. Em 1979, apareceu – vestida – ao lado de Alain Delon no filme Aeroporto 80 – O Concorde, mas não conseguiu superar o antigo rótulo. Em 1988, estrelou The Arrogant, que foi traduzido no Brasil como Os Desejos de Sylvia Kristel.

Na década de 1990, voltou a interpretar Emmanuelle, já madura, para a televisão. Consta que ela chegou a declarar que fez filmes menores por sua dependência pela cocaína. O glamour sai da rota nos anos 2000 e, em 2006, lança sua autobiografia, Nue, em que revela o declínio financeiro e os problemas com álcool e drogas, inclusive heroína. Sylvia era culta e também gostava de pintar. Os últimos anos de sua vida foram em Amsterdã e faleceu aos 60 anos, em 2012, de um câncer, no mesmo ano em que teve um AVC. “Todos os homens se aproximam de mim pensando que sou uma deusa na cama, mas não sirvo como esposa”, costumava dizer. Todos os homens nunca se esqueceram de Sylvia Kristel.

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