A exposição “Pourquoi pas?” – ‘Por que não?’, em francês – será aberta no dia 2 de dezembro na galeria Rabieh, nos Jardins, mas já está “causando” nas redes sociais. Criada por Alexandra Loras, ex-consulesa da França no Brasil, a mostra apresenta, com a ajuda da tecnologia, 20 celebridades brancas que por interferência digital tiveram a pele escurecida, e algumas ganharam até penteados afro. Entre as personalidades retratadas na exposição, que tem curadoria do artista e grafiteiro paulistano Énivo, estão Silvio Santos, Dilma Rousseff, João Doria, Xuxa, a rainha Elizabeth II, Ana Maria Braga, Gisele Bündchen e William Waack – só para citar alguns nomes.
Nesta terça-feira Alexandra foi atacada em sua página do Instagram por conta da mostra em questão, acusada de fazer uso do “blackface” – técnica de maquiagem teatral adotada no século 19 por atores americano brancos que pintavam seus rostos com carvão para representar negros de forma estereotipada e jocosa.
“Em momento algum essa antiga prática norteou a concepção das obras da minha exposição. Como sou negra, abordar a negritude é meu espaço de fala. Se Gisele Bündchen estivesse se pintando de ‘nega-maluca’, seria um blackface, mas eu como negra, modificar a estética da narrativa visual dessa forma, é arte. Arte engajada, onde deixo minha liberdade criativa se expressar. Meu objetivo é fazer uma reflexão sobre o protagonismo do negro na sociedade brasileira sem dar qualquer conotação pejorativa aos personagens retratados, mas sim mostrar como o eurocentrismo atual é chocante e absurdo, pois nós não somos representados de maneira digna, respeitosa e igualitária. Ao propor um mundo ‘invertido’, com negros em papéis de destaque na sociedade, me pergunto se faríamos os mesmos comentários preconceituosos ou se teríamos as mesmas posturas. Meu desejo é provocar uma reflexão e não resgatar uma ferramenta considerada racista e que ridiculariza o negro”, reflete. Alexandra se defendeu dos ataques publicamente e conversou com o Glamurama com exclusividade. Abaixo nosso papo com ela:
Glamurama: Qual é o objetivo dessa exposição?
Alexandra Loras: Nosso grupo tinha dois objetivos: mostrar que existem sub-representações dos negros dentro da chamada “elite” brasileira” e em outros meios sociais. Apresentar grandes personalidades brancas com pele negra é uma maneira de lembrar que os afrodescendentes, embora sejam a maioria no Brasil, continuam tratados como minoria entre os homens e as mulheres que detêm poder e influência, seja isso no meio político, nas mídias ou nos negócios. Dessa maneira, queremos denunciar “visualmente” essa desigualdade que existe de maneira tão explicita à primeira vista. Quem hoje teria a ideia de expor os retratos de Martin Luther King, Angela Davis, Malcom X com a pele branca?
Glamurama: Colocar o público em frente aos “dublês” negros dessas celebridades brancas faria com que enxergassem: uma ex-presidente, uma top model mundialmente renomada, ou uma caricatura negra destas celebridades brancas?
Alexandra Loras: Nós não vamos questionar o público na saída da exposição. Não se trata de estigmatizar ninguém, mas sim de mostrar por meio desta experiência visual e artística, que as pessoas podem eliminar certos preconceitos que talvez não conheçam.
Glamurama: O que você acha da acusação de blackface da exposição? Isso foi proposital? Você esperava isso da parte do público?
Alexandra Loras: Sabíamos que esta exposição poderia incomodar. Mas a arte seria ainda arte se ela fosse unanimidade e não causasse debate? Uma das funções da arte não é ter um impacto na sociedade, questionando regras sociais e quebrando os códigos atuais? Os artistas Matisse, Derain e Vlaminck foram vaiados e causaram escândalo no Salão de Outono de Paris em 1905. Depois dessa repulsa, o “Fauvismo” foi criado e se tornou um dos principais movimentos da pintura do século XX. Com o nosso titulo “Pourquoi pas?” obviamente não pretendemos mudar o curso da arte do século XXI. Como já disse, a intenção é de estimular o debate e o questionamento da sociedade atual. Por consequência, respeitaremos todas as opiniões que foram ou serão formuladas, por mais duras que sejam. Algumas criticas vêm até das grandes figuras da comunidade negra, por quem temos respeito e admiração. Esses pontos de vista nutrem esse debate que consideramos indispensável e saudável. Referente à critica de fazer “blackface”, acho que se tiver blackface ela não está nos retratos dessas celebridades brancas com pele negra, mas muito mais no olhar de uma parte das pessoas, que enxergam nestes primeiramente (ou unicamente) a cor negra ou, ainda pior, uma caricatura do negro. (Por Matheus Evangelista)
“Pourquoi pas?” na Galeria Rabieh
De 2 de dezembro até 14 de janeiro
Alameda Gabriel Monteiro da Silva, 147