Com mais de 40 anos de carreira, Alceu Valença se viu obrigado a ficar longe da estrada e dos palcos por conta da pandemia, mas tem feito o possível para se manter próximo da arte e de seu público – um dos mais variados entre os intérpretes brasileiros, com hits que embalam dos avós aos netos. É fácil você ir numa balada ou festa de adolescente e ouvir “Anunciação”. E tudo isso foi reforçado depois da vitória da paraibana Juliette no BBB deste ano, em que ela cantou por diversas vezes as canções de Alceu e até o encontrou em uma live feita recentemente.
Junho, mês tradicional das comemorações de São João, é uma das épocas em que o cantor mais roda o país, e em poucos dias. Para provar sua intenção de estar próximo dos fãs e manter a tradição junina, Alceu vai fazer uma live nesta sexta-feira para trazer um pouco de alegria e esperança em tempos tão complicados.
Artista de sucesso, o pernambucano de 74 anos, que compôs diversas músicas e gravou nada menos do quatro álbuns durante a pandemia, saiu do estúdio, onde estava mixando esses trabalhos, para conversar com Glamurama sobre memórias, a saudade da estrada, o reencontro com seu violão, vacina contra a Covid-19 e novos tempos. Ao papo! (por Baárbara Martinez)
Glamurama: Você já tem shows marcados para 2022 na Europa. Qual a expectativa para o retorno aos palcos aqui no Brasil? Está com saudade das apresentações?
Alceu Valença: Eu tinha 45 shows no Brasil até chegar o São João, e mais 14 na Europa. Tudo foi adiado. Gravei quatro álbuns na pandemia, estou aqui no estúdio mixando eles. São trabalhos em que eu só toco violão […] Sou uma pessoa que estive sempre na estrada, sempre. Eu digo até que não moro em cidades, namoro elas. Fico lembrando das ruas, dos locais, dos amigos… O Rio de Janeiro sempre foi o meu ponto, mas era muito pouco tempo que passava na cidade, apenas três dias na semana. Eu viajava e só voltava para ficar com meu filho. O único canto que fico sem fazer nada, tranquilo, por 15, 20 dias direto é em Lisboa, Portugal. É o único descanso, possuo uma intimidade maior na minha casa em Lisboa do que com a do Rio.
G: Poderia adiantar algo sobre os novos trabalhos?
AV: O segundo disco vai chamar ‘Saudade’ (o primeiro foi “Sem Pensar no Amanhã”, lançado em março deste ano), em que tem uma música que canto: “Saudade da estrada, saudade da rua, saudade do sol, saudade da lua, ê saudade. Saudade de amigos, como eu confinados, que mesmo distante estão ao meu lado, são vídeos, lembranças, recados falados, retratos de um álbum já tão desbotado, xô saudade. Meu bem, me acalma, respire o agora e esqueça o passado, os meses e as horas. Projeto um planeta mais civilizado, com mais empatia, sem pobres coitados, mendigos de rua e desabrigados”. Chocante quando eu saio na rua, quando vou na farmácia, claro, protegido, e vejo mendigos no meio da rua. Ô meu Deus do céu. Está demais!
G: O que significou para você fazer shows virtuais, sem a presença de público?
AV: Ano passado eu fiz shows virtuais, lives. O que acontece é que enquanto estou cantando as câmeras estão me filmando, uma dando close, outra no plano geral, então me comunico assim. Sei que as pessoas estão me vendo do outro lado. Eu fico pensando que não é o programa do Chacrinha, mas é o programa de Alceu. O do Chacrinha era feito dentro de um estúdio, como era o programa de Faustão também, e tantos outros que eu fiz assim[…] Claro que é uma outra forma de assistir, que, aliás, vai perdurar por muito tempo. Claro que irá ter o show presencial [após a pandemia], mas pode ter a transmissão exibida para outro local também.
G: Você comentou sobre a saudade da estrada, dos locais por onde passa. Costuma usa a tecnologia para tentar “matar” essa saudade?
AV: Fico falando pelo WhatsApp com meus amigos, falo com Portugal, com a França, falo com Santa Catarina, falo com São Paulo, com minha irmã todos os dias, com os meus irmãos. Vou matando o tempo assim…
G: O que você fez de diferente durante o isolamento social em seu apartamento no Rio de Janeiro?
AV: Eu fui ficando dentro de casa o tempo todo. Nisso, eu passei a reler algumas coisas, livros, mas ficou meio complicado por causa da obra do vizinho, que está sendo feita há um ano. A porrada dá direto no meu quarto, todo dia. Desta forma, me encontrei com meu grande amigo do Rio de Janeiro: o meu violão. Só tocava de noite, por causa da obra, enquanto meu filho ficava no computador e minha mulher assistindo séries, eu ficava na sala.
G: É curioso que você tenha visto o instrumento de outro modo.
AV: Os meus violões ficam normalmente com a equipe técnica, que levam os instrumentos para os shows, e eu acabava não ficando com eles nos hotéis, porque só usava o local para dormir e no dia seguinte ir para outro lugar. Por causa da pandemia, a gente se reencontrou. Nisso, comecei a fazer músicas que se relacionam, roteiros cinematográficos, musicais. Eu cantava uma música e puxava outra em seguida. Até que um dia fiquei tocando até 23:30, 00:00, e quando fui para o quarto, a minha mulher disse que achou bonito, pensei que ela estava falando sobre algo na televisão, mas não era, ela disse que achou bonito o que eu estava tocando, que dava um disco. Fiz o primeiro disco, depois fiz o segundo, e assim foi indo…
G: Você tomou a vacina contra a Covid-19. Estamos em um momento conturbando em que algumas pessoas não confiam no imunizante ou andam escolhendo o tipo de vacina. Se pudesse dar um recado sobre isso, qual seria?
AV: Sempre disse que tudo que for aprovado pela ANVISA, eu tomo. Eu tomei a Coronavac, já fiz meu teste para saber como está minha imunidade. Está altíssima! O único efeito colateral que eu digo, é que estou falando mandarim com uma fluência muito grande, porque através da vacina estou falando mandarim e qualquer hora vou fazer show em Pequim (risos). Minha mulher, que fala inglês, depois que tomou a Astrazeneca, está falando em sotaque britânico. Eu acho que depois de um tempo, se vier uma vacina para alguma outra coisa, pretendo tomar uma espanhola, para poder falar fluentemente (risos). Quando saio, fico de máscara o tempo todo, inclusive por uma questão de empatia. É importante pensar nos outros também, porque você pode estar imunizado, mas pode ser transmissor também. Precisamos de cuidados e acabar com determinadas paranoias, essa história de que tal vacina faz mal. E quem tomou a primeira dose, que tome a segunda.
G: O que esperar da sua live nesta sexta-feira?
AV: Não tem participação especial não. Eu tenho vários tipos de shows: Carnaval, rock, violão, teatro, ou de São João. São vários tipos. Esse que eu vou fazer para o mês junino, é uma live com músicas do repertório, sob tudo de São João. Tem duas, três músicas que não são, mas 90% é de São João. Neste momento, eu estava cantando uma música chamada “Senhora Estrada”. Agora (se não fosse a pandemia) eu estaria na estrada. Eu podia estar em qualquer parte do Brasil, como, por exemplo, em Vitória da Conquista, mais no sertão, Caruaru, Campina Grande, Pesqueiro, Arco Verde, estaria em Petrolina, poderia estar também em Aracaju.
Amanhã, durante a live, Alceu estará acompanhado por André Julião (sanfona), Tovinho (teclados) Leo Lira (guitarra), Nando Barreto (baixo), Cássio Cunha (bateria), a partir das 20h, diretamente do palco do Teatro Bradesco, em São Paulo, com transmissão gratuita e exclusiva pelo YouTube do teatro.