Sete horas de avião, sete horas de carro e oito horas de barco depois, Alberto Hiar, dono da Cavalera, Helga Fuchs, consultora de comunicação da marca, e David Pollack, stylist, chegaram à tribo indígena Mutum, de etnia Yawananá, no Acre. “Como o barquinho de alumínio não tinha encosto, levamos cadeiras de praia para ter um pouco de conforto na viagem”, disse Alberto, que acabou de voltar. Lá na tribo, habitada por 100 índios, o banheiro era um buraco no chão. Para tomar banho, Alberto, Helga e David usavam o rio. Foram três dias assim, um refúgio no meio da floresta, sem acesso à internet, luz elétrica, nada. “Foi uma cura espiritual não usar celular, ficar afastado do mundo”, contou Alberto. Confira a entrevista:
Glamurama: Como é a cultura da tribo?
Alberto Hiar: Percebi que existem tribos e existem vilarejos. A última tem estrutura, com direito a supermercado. Achei isso estranho. Gostei mesmo de entrar em contato com a tribo que não tinha luz, internet. O Mutum é hospitaleiro e preza a cura espiritual. Eles me contaram a história deles: a chegada dos seringueiros, a entrada da igreja evangélica e como eles conseguiram se afastar de tudo isso e entrar novamente em contato com a sua cultura.
Glamurama: O Mutum tem algum ritual?
Alberto Hiar: A bebida sagrada Uni. É um chá psicotrópico que gera dois efeitos: refluxo ou diarreia. Eu tive refluxo, que segundo a tribo, significa limpeza espiritual. Existem também os festivais, feitos para mostrar a cultura da tribo para turistas. Os índios criam pulseiras, cocares e lanças para vender aos visitantes. O artesanato é o maior fonte de renda da tribo. E por falar nisso, quando cheguei à aldeia, fui recebido com um incenso extraído de seiva e queimado no carvão. O cheiro foi tão incrível que eu comprei deles.
Glamurama: Como foi o seu dia a dia lá?
Alberto Hiar: Foi a primeira vez que eu conheci uma aldeia. A pesca era incrível: os índios esmagavam uma planta e jogavam no rio, aí os peixes adormeciam e eles pegavam o bicho com a mão. Meu café da manhã era rodeado por nativos, sempre ouvindo a história deles. Levaram a gente para uma cabana espiritual, conhecer uma árvore que tem mais de 800 anos e ver onça e jiboia, mas desse programa eu não quis participar. Todo fim de tarde, os índios cantavam juntos e faziam brincadeiras. Existe um jogo em que o homem segura uma cana de açúcar e as mulheres tiram dele. Só que elas batem que nem homem e podem fazer o que quiserem para resgatar a cana. Uma voou em cima de mim e eu cai e desmaiei.
Glamurama: Porque você teve interesse em conhecer a tribo?
Alberto Hiar: Há quatro anos, eu viajo o mundo em períodos de 4 a 5 meses; sempre em destinos têxteis na França, Turquia, China e Índia. Ultimamente, eu tenho tido vontade de conhecer lugares novos. No ano passado, fui para Bali e dessa vez quis visitar uma tribo. Agora, vou para Butão em janeiro ficar quatro dias de férias. É que a data bate com as minhas viagens a trabalho para Índia e China.
Glamurama: Esta viagem vai inspirar uma coleção da Cavalera?
Alberto Hiar: É impossível dizer que a viagem não me moveu e me inspirou de alguma forma. Mas eu fui com a vontade de desconectar do mundo, mesmo.
Glamurama: O que você levou da cultura do Mutum para a sua vida?
Alberto Hiar: Cheguei a conclusão de que você não precisa de tudo o que busca. O índio caça e colhe o que ele precisa para se sustentar. Enquanto isso, a gente corre atrás de ter dez sapatos no armário, por exemplo, só para depois ficar infeliz porque não temos o par que o outro tem.
Glamurama: De que forma os índios se parecem com a gente?
Alberto Hiar: É complicado responder isso porque depende da tribo. Mas no caso do Mutum, a tribo é muito unida, os índios se respeitam. Do mesmo jeito que uma tribo de skatistas se respeita. Eu percebi, também, que os índios não querem a loucura da cidade. Alguns saem da tribo em busca de algo maior, mas voltam, pois se dão conta de que a gente tem nada e eles tudo.
Glamurama: Você pretende voltar à tribo e conhecer outras também?
Alberto Hiar: Quero voltar à tribo em agosto para participar do festival deles. Mas, antes disso, pretendo trazê-los a São Paulo, em maio ou junho, para divulgar o evento. Vou, também, patrocinar o time de futebol do Mutum, fornecendo uniforme, meia e bola de futebol. Quanto a outras aldeias, quero visitar uma tribo mais afastada, a Lainca, que vive ainda mais em contato com a natureza. Também quero conhecer a Himba, na Namíbia, na África. Gostaria de agradecer a Maanaim Turismo e nosso guia nesta expedição, João Bôsco Nunes, que foi incrível com todo seu conhecimento.
(Por Manuela Almeida)
[galeria]1916591[/galeria]