Ele até era um bom malabarista, mas ser palhaço não estava no destino de Ailton Graça, que começou a carreira no circo, ainda criança. O picadeiro ficou pequeno para o seu talento, que é a habilidade em fazer rir. Com currículo recheado de papéis cômicos, ele conta que viver o travesti Xana Summer, personagem da novela Império, foi desafiador justamente pela dificuldade de transitar entre a comédia e a tragédia. O ator pareceu tirar de letra, no entanto, a tarefa de interpretar o geógrafo e ativista Milton Santos no especial Falas Negras, da Globo. No papo com a J.P, ele conta que viu tantos programas de gastronomia na quarentena que quase virou master chef e que luta há 20 anos para convencer sua mulher de que é um cara legal.
Por Fernanda Grilo para a revista JP
J.P: UMA EXTRAVAGÂNCIA?
AILTON GRAÇA: Sair de São Paulo uma hora da manhã para comer a coxinha da padaria Real, em Sorocaba. É comer e voltar, uma loucura, mas sou apaixonado.
J.P: MAIOR LOUCURA DE AMOR?
AG: Faz 20 anos que estou tentando convencer minha esposa de que sou uma pessoa legal.
J.P: PARA QUEM FARIA UMA APRESENTAÇÃO PARTICULAR?
AG: Se o Spike Lee aparecer na minha frente, não faço nem a peça, desmaio. Pronto, caiu.
J.P: PAPEL DA VIDA?
AG: O mais desafiador foi a Xana Summer, de Império, que variava do trágico ao cômico.
J.P: QUEM GOSTARIA DE INTERPRETAR?
AG: O Mussum, genuinamente brasileiro. Ele tem traços no modo de ser que mexem muito comigo, a paixão pela Mangueira, o samba, o “se vira nos 30”.
J.P: QUEM TE REPRESENTA?
AG: Como a pergunta não me permite falar das 200 mil pessoas que amo, e para não parecer
injusto, vou citar o professor Silvio de Almeida.
J.P: RIR OU FAZER RIR?
AG: Meu trabalho é focado no palhaço que ri de si mesmo, mas como ultimamente a gente tem enfrentado uma balança política, tenho preferido rir da piada alheia.
J.P: COM O QUE VOCÊ DÁ RISADA?
AG: Esquetes. Recentemente, o Embrulha pra Viagem fez uma dizendo à população que se sente fortalecido porque ninguém está se distanciando. É o vírus conversando com as pessoas (risos).
J.P: MELHOR PIADA QUE JÁ OUVIU?
AG: O Yuri Marçal comentando as canções da Alcione. Hilário!
J.P: O QUE ESPERAR DE 2021?
AG: “Respirar”, como pediu George Floyd.
J.P: QUAL A FALA NEGRA MAIS IMPORTANTE NESTE MOMENTO?
AG: Parem de nos matar.
J.P: O QUE ESCREVERIA NA SUA MÁSCARA?
AG: “Vamos cuidar uns dos outros como se fosse uma só tribo”, do filme Pantera Negra.
J.P: QUAL VACINA O MUNDO ESTÁ PRECISANDO?
AG: A do amor! Para que seja transformador, é preciso estar no lugar do outro.
J.P: O MELHOR E O PIOR DA QUARENTENA?
AG: O melhor foi ficar em casa e arrumar todos os livros e recortes direitinho. O pior foi perder tanta gente bacana, mestres que foram embora e vão fazer falta.
J.P: APRENDEU ALGUMA COISA DURANTE O ISOLAMENTO?
AG: Que a janela é um bom lugar para observar, além de ficar mais próximo do armário, fogão e geladeira. Era tanto programa de gastronomia que achei que ia virar o próximo master chef.
J.P: O QUE TE FAZ QUEBRAR A DIETA?
AG: Panceta, barriga e joelho de porco…oh meu Deus do céu.
J.P: VÍCIO?
AG: Samba, Carnaval, estar envolvido, aprender tudo, viver isso o tempo todo. Sofro de abstinência.
J.P: SONHO A SER REALIZADO?
AG: No macro quero que parem de nos matar, que toda essa questão ligada ao racismo seja resolvida. O micro é levar a escola de samba Lavapés Pirata Negro para desfilar no grupo especial do Carnaval de SP, no Anhembi.
J.P: UM TALENTO QUE NINGUÉM CONHECE?
AG: Gostava muito do circo e achava que era um bom trapezista, mas o ator ganhou tanta força depois…
J.P: O QUE NUNCA DIZER PARA OUTRA PESSOA?
AG: Que ela não é capaz.
J.P: MOMENTO MAIS BRILHANTE…
AG: Posso ser o contrarregra, mas quero sempre estar no palco.
J.P: QUANDO MENTE?
AG: Quando estou atuando. A gente dá a alma, se rasga, mas é ficção. Amo ser mentiroso nesse sentido.
J.P: COMO GOSTARIA DE MORRER?
AG: Em uma cena no estilo grand finale em que me despeço da vida para viver na eternidade.