Vencedora dos dois prêmios mais importantes da TV americana no ano passado – o Emmy e o Globo de Ouro de Melhor Série Dramática – “The Handmaid’s Tale” estreia no Brasil neste domingo, às 21h, no canal pago Paramount. A série é baseada no best-seller “O Conto da Aia”, publicado pela canadense Margaret Atwood em 1985, e considerado um dos maiores romances de apelo feminista das últimas décadas. A escritora, aliás, faz uma ponta no primeiro episódio.
Descrita pela revista “The Hollywood Reporter” não somente como a melhor novidade da televisão dos Estados Unidos em 2017, mas também como a mais importante, a atração foi adaptada para a telinha por Bruce Miller (o criador de “The 100”) e é estrelada por Elisabeth Moss, que também faz as vezes de produtora executiva. Trata-se da principal aposta do serviço de streaming Hulu, um dos maiores concorrentes da Neflix no hemisfério norte, nestes tempos de revoluções digitais no segmento de entretenimento.
Resumindo em poucas palavras, “The Handmaid’s Tale” aborda um futuro distópico e aterrorizante no qual mulheres são tratadas como cidadãs de segunda classe, em um regime teocrático naquilo que no passado foi os Estados Unidos. A constituição americana deu lugar à Bíblia, e as mulheres férteis – a maioria delas não pode dar à luz por conta de um vírus que ameaça a população global – se tornaram propriedade do estado e escravas sexuais.
Sentiu o clima por trás da coisa? Então continua lendo porque a seguir a gente revela quatro fatos surpreendentes sobre “The Handmaid’s Tale”, cuja segunda temporada estreia em 26 de abril nos EUA… (Por Anderson Antunes)
Sexo a três, mas sem diversão
Margaret teve a ideia de escrever o livro no qual a série é baseada depois de ler um versículo da Bíblia – “Vendo Raquel que não dava filhos a Jacó, teve inveja de sua irmã, e disse a Jacó: Dá-me filhos, se não morro. E ela disse: Eis aqui minha serva Bila, coabita com ela, para que dê à luz sobre meus joelhos, e eu assim receba filhos por ela” (Gênesis 30:1:3). Basicamente, esse é o ponto central da obra, e a partir dele surgem algumas das cenas mais chocantes em sua versão televisiva, com as “handmaid’s” (“aias”) dividindo a cama com as mulheres dos líderes em uma cerimônia sexual sem qualquer tipo de troca de carícias que acontece uma vez por mês, a fim apenas de engravidá-las. Apesar do fundo religioso na história, a escritora canadense sempre garantiu que nunca pensou em criticar a fé de ninguém, mas em abordar os perigos do totalitarismo, seja ele de cunho espiritual ou não.
Cada um no seu quadrado
Todo o figurino que é destaque na série foi retirado do livro de Margaret, a começar pelos uniformes das aias: capas vermelhas com uma espécie de chapéu branco que impede a visão lateral delas. A escritora explica no romance que o look é inspirado em Maria Madalena, descrita na Bíblia como “uma pecadora arrependida” e sempre retratada em obras de arte usando a cor. Elisabeth e outras atrizes da série, como Alexis Bledel, já comentaram que o chapéu, particularmente, é extremamente desconfortável. Já as mulheres dos líderes, as que desfrutam de mais autonomia, usam azul, cor relacionada a um comportamento passivo e até frio e atribuída à Virgem Maria. As empregadas (conhecidas como “marthas”), vestem somente verde, sempre desbotado e opaco, representando a calmaria e o cuidado doméstico, a principal função delas. Há ainda o marrom, a cor que representa a autoridade das “tias”, as treinadoras das aias, e o rosa claro usado pelas crianças. No caso destas últimas, elas são raridade, já que são consideradas como milagres em um planeta quase que totalmente infértil.
Era uma vez… a América!
Os Estados Unidos como nós o conhecemos são coisa do passado em “The Handmaid’s Tale”. Um novo país, batizado República de Gileade, é instaurado por um grupo cristão militar autointitulado “Filhos de Jacó” que ataca com sucesso e ao mesmo tempo a Casa Branca e o Congresso dos Estados Unidos e substitui a constituição americana pela Bíblia. O objetivo do novo regime é estabelecer uma nova ordem mundial baseadas em preceitos retirados do Velho Testamento, com a criação de castas sociais. As mulheres perdem todos os direitos, desde ler qualquer coisa que seja a ter conta em banco. Tudo é contado em primeira pessoa por Offred, a personagem de Elisabeth, cujo nome real é June. Offred, aliás, é como ela passa a ser conhecida depois que é capturada tentando fugir para o Canadá, e quer dizer “Of Fred” (“De Fred”), além de ser um trocadilho com a palavra em inglês “offered” (“oferecida”), sendo que o Fred em questão é o patrão, interpretado por Ralph Fiennes. Ele é um dos líderes idealizadores de Gileade e tenta ser amistoso com a nova serva (a anterior não aguentou a barra e se matou).
Saiu de linha, é punido
O controle total que passa a valer a partir da tomada de poder pelo Filhos de Jacó é tamanho, que até mesmo os cumprimentos foram alterados. Simples “Hellos” e “Goodbyes” passaram a ser “Sobre o seu olho”, “Abençoado seja o fruto” e “Que o Senhor possa abri-lo”. Além disso, mulheres não podem andar sozinhas nas ruas e todos são vigiados constantemente por agentes da polícia do estado, conhecidos como “Olhos”. Vez por outra, as aias se reúnem e, a mando das tias, são obrigadas a apedrejar ou bater até a morte homens e mulheres que quebraram regras. Por mais chocante que possa parecer, Margaret garante que tudo que descreve no livro tem respaldo histórico e já aconteceu no passado: acontecimentos descritos na Bíblia, a Revolução Iraniana de 1978-1979, a estourada contra o feminismo nos anos 1980… Por causa disso, ela não considera que seu trabalho mais famoso seja uma peça de ficção.