Cerca de 25 milhões de homens no mundo sofrem calados com o nível baixo de testosterona
no sangue, que faz a libido despencar e deixa o ânimo no pé. Isso tem nome e remédio, mas o assunto ainda é tabu.
Por Chico Felitti para a Revista PODER de junho || Ilustração: Bruna Bertolacini
A geladeira de um ex-ator global cinquentão e enxuto, que mora em Higienópolis, bairro nobre de São Paulo, esconde um segredo: garrafinhas de vidro transparente cujo habitat seria um consultório médico. O artista, de camiseta branca justa nos braços e folgada na barriga, explica quase num sussurro o que são os tais frascos: ampolas de testosterona que ele usa em injeções para retardar a perda de massa muscular, o cansaço que começa a pesar com o passar dos anos e o crepúsculo da libido. O inimigo dele tem nome: andropausa, o equivalente masculino da menopausa. Ainda que esconda do mundo seu sofrimento, esse ator de cabelos pretos tingidos duas vezes por mês não está sozinho. Estudos de Harvard mostram que 25 milhões de homens no mundo sofrem com a deficiência de testosterona.
A testosterona é um hormônio essencial para os meninos crescerem, ganharem massa muscular e virarem homens. Seu auge no sangue é entre a primeira e a segunda década de vida. O declínio – pelo menos da taxa do hormônio – se inicia aos 20 e poucos anos. Há homens que sentem a falta da substância já a partir dos 30 anos. “É uma condição comum, mas com um tratamento que tem resultados satisfatórios”, explica Marcos Cabrera, professor de geriatria da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Remédios para isso não faltam: injeções de hormônio a cada três meses, um gel que é absorvido pela pele ou um desodorante roll on com o hormônio na composição que deve ser manipulado com receita médica. Comprimidos à base de testosterona, a primeira forma de tratamento, popularizado nos anos 1960, são cada vez menos indicados por causar danos ao fígado com alguma frequência. “Não adianta se encher de testosterona. O corpo gosta de equilíbrio.” O especialista usa os marombados da academia como exemplo. “Muitos se entopem de testosterona. E por causa disso têm mais tesão? Só se for pelo que veem no espelho”, diz o médico.
NAS MELHORES FAMÍLIAS
O máximo de peso que o empresário Marcos Calsim, de São Carlos, levanta é o patacão Montblanc que leva no braço esquerdo. Mas ele começou a usar testosterona aos 55, um ano atrás, aconselhado por um médico. Questionado sobre o porquê, é anatomicamente explícito: “Não é músculo que me preocupa. É aquele pedaço de carne sem músculo. Antes, eu conseguia segurar [com a ereção] uma toalha de banho e hoje em dia só seguro um lenço de seda. Daí, comecei a usar Viagra, muito Viagra, e foi assim por anos. Até descobrir o que eu tinha”, Essa não é a abordagem mais adequada, segundo a medicina. “Muitos homens tomam remédios para disfunção erétil e, na verdade, estão só burlando o problema”, diz Marina Johnson, chefe do Institute of Endocrinology, que fica em Destin, na Flórida, Estados Unidos. A médica, que pesquisa os efeitos da curva descendente do hormônio masculino no corpo, ressalta a importância de uma terapia que acontece fora do consultório: o diálogo. “Se os homens conversassem mais sobre esse assunto, veriam que não estão sozinhos e se dariam conta quando algo estivesse errado.”
O caso é que há realmente pouco papo sobre isso. O assunto é tabu. PODER procurou empresários e artistas para comentar sobre as mudanças do corpo com o passar das décadas. Nenhum topou falar abertamente. Até os mais desbocados preferiram o silêncio – caso do cantor Supla, cujos cabelos platinados escondem os 51 anos: “Falar disso? Not interested!”. Tá bom. Já Oscar Maroni, dono do inferninho paulistano
Bahamas e autointitulado “empresário dos prazeres” peita o tema. “Transo duas vezes por semana. Não é a mesma coisa, claro. Antes, eu conseguia correr. Hoje, dou um trotezinho de vez em quando. A ereção fica alterada” , diz ele, aos 66.
Os médicos concordam que uma vida saudável pode atrasar a chegada do crepúsculo. “Comer direito, se exercitar ao menos três vezes por semana, evitar situações de estresse e dormir bem são fatores que ajudam o homem a continuar ativo por mais tempo. Pode parecer senso comum, mas é o que muitos estudos apontam”, diz Marina Johnson. Vale dizer que existe certa paranoia ao redor do tema. “Já recebi homens de menos de 40 anos que estavam muito preocupados com o assunto. Muitas vezes o paciente chega se queixando da libido baixa, mas a testosterona está normal. Pode ser por outros motivos: certos medicamentos, alcoolismo, drogas, depressão…”, conta o doutor Cabrera, que prescreve um pouco mais de calma na hora de lidar com a questão. “Esse declínio da potência sexual é natural. O envelhecimento é um conjunto de perdas físicas, mas também é um conjunto de ganhos de outras ordens. O sujeito fica mais esperto, com uma pegada melhor porque aprendeu o que agrada às mulheres.”
Como se o espectro da perda de potência não bastasse, na maioria dos casos, a andropausa geralmente chega de mãos dadas com a crise da meia-idade. E não adianta sair correndo atrás de um frasco de testosterona, caso o pique não seja mais o mesmo. Até porque a reposição hormonal não vem sem risco. Testosterona pode ter efeitos colaterais, ponderam os médicos. Um deles é o câncer de próstata, outro vilão do homem pós-50, e causar acne tardia. Por causa disso, o empresário Marcos Calsim diz que, além da testosterona, as sessões semanais de psicanálise também fizeram muita diferença em sua vida. “É um fardo que a gente carrega sozinho. É duro.” Ou não. Com o devido tratamento, pode voltar a ser.
PONTO MORTO
Algumas pistas de que o nível de testosterona pode estar baixando:
• baixa libido
• disfunção erétil
• desânimo
• irritabilidade
• perda de massa muscular
• dificuldade de concentração
• ginecomastia (aumento das mamas)
PONTO DE BALA
Caso note algum dos sintomas acima, procure o médico em que tem mais confiança. Pode ser um profissional de alguma destas especialidades:
• Cardiologia
• Endocrinologia
• Geriatria
• Psiquiatria
• Urologia
*Fontes: Dr. Marcos Cabrera (geriatra) e Dra. Marina Johnson (endocrinologista)
FÔLEGO DE TIGRÃO
Conhecido como Príncipe na época da jovem guarda, Ronnie Von, que hoje tem 72 anos, fala sobre seus hormônios:
“As mudanças são evidentemente esperadas. Aprendi com o meu pai, que morreu com 99 anos, completamente lúcido: ‘A idade mental de um homem não passa de 25, só que o corpo não entende’. Não é um mantra, mas levo isso comigo. Do ponto de vista hormonal, não sinto muita diferença. Tenho uma vida sexual com a minha mulher que é de adolescente. Ela tem 62 anos e eu fiquei sabendo com um amigo meu, sexólogo, que a maior falácia do mundo é que a mulher perde a libido após a menopausa. Ela fez reposição hormonal. O médico dela avisou: se prepare que ela vai ficar com 20 e poucos anos de novo. Uma semana depois, eu liguei para me queixar. ‘Por quê? Ela não ficou com libido de uma garota de 20 anos?’ Não, eu respondi, ficou com a libido de uma menina de 17! Eu não fiz nenhuma reposição, porque faço exames sempre e o nível de testosterona está normal. Essa história de andropausa é passível de discussão. Basta encostar um dedo em mim que eu já rolo no chão. Isso com a idade que tenho – imagine antes.”