Vinte anos depois da morte trágica, nosso colunista Antonio Bivar mergulha nos segredos que permeiam a história da “princesa do povo”
Por Antonio Bivar para a Revista J.P de junho
Quase não mais se falava da princesa Diana. Os que dela se lembravam se admiravam por ela andar tão esquecida. Mas agora ela voltou a ser vastamente cultuada. Em sua antiga moradia, o Palácio de Kensington, acontece uma exposição superseletiva de quase 30 peças de seu famoso guarda-roupa. A mostra, aberta ao público, vai até fevereiro de 2018. A moda e as revistas de moda e comportamento em seus editoriais revitalizam o estilo Lady Di. É que 2017 lamenta os 20 anos de sua trágica morte, em Paris, no dia 31 de agosto de 1997.
A menina Diana Frances Spencer, nascida em Norfolk de uma família da aristocracia e da nobreza britânicas, hoje, se viva, divorciada de Charles e, quem sabe, casada de novo, aos 55 anos, mais que tudo, talvez estivesse curtindo uma de avó. Sem perder nada do estilo que fez sua marca registrada.
Que turbilhão foi a vida da princesa de Gales, o ícone mais representativo do conto de fadas com final infeliz, que foram as décadas de 1980 e 1990, quando seu brilho extrapolou. Desde a imagem da professorinha ingênua e tímida que, aos 19 anos, conquistou o herdeiro do trono. O namoro, o noivado, o casamento do século – e aquele vestido de noiva new romantic farfalhado de tafetás, a lua de mel em tudo que era céu, o assédio da legião de paparazzi, o vazamento do caso de Charles com Camilla Parker Bowles, enquanto Diana, mãe extremada, levava diariamente os dois filhos ao jardim da infância em Notting Hill. Seu corte de cabelo, no estilo mantido desde sua aparição na mídia até a morte era, então, feito num salão modesto, mas eficiente, ali perto da escola dos filhos. Nada intelectual, no sentido de formação acadêmica, gostava da música pop jovem e estilosa (Duran Duran, George Michael) e de moda. Afinal, seu biótipo era de top model, quase abulímica. Gianni Versace era o favorito. E Versace adorava criar exclusivos para a mais “distinguished” entre as espevitadas princesas de sua geração. Rumores, traições, “too much too soon”, a separação. Diana e Charles não mais se entendiam. Jovem, carente e traída, Diana arranjou novo amor. Que também vazou na mídia. Confissões e roupas sujas lavadas em tabloides e programas de televisão. A embaixatriz do Brasil em Londres, Lúcia Flecha de Lima, era sua “best friend” e confidente. Entre elas segredos que ambas levariam para seus respectivos túmulos. Segredos, a maioria de conhecimento público, mas que só ganharão tona daqui a algumas gerações, já como parte da ficção histórica.
Caridosa e atuante, Diana participou ativamente de várias campanhas. No Brasil foi fotografada com crianças do morro e segurando a mão de um aidético terminal num quarto de hospital carioca. Boa mãe que era, adorava os filhos, os pequenos príncipes William e Harry. E hoje, avó, certamente amaria o casal de netinhos e a nora, Kate. Pois Diana era assim. Quanto aos filhos, hoje crescidos e bem encaminhados, de acordo com o zeitgeist William será rei assim que a mais longeva das rainhas do Reino Unido decidir passar o trono. Dos filhos de Diana, o caçula, Harry, solteiro, amadurecido e ajuizado, tem confessado sentir, agora mais que nunca, a falta da mãe. Como se, até então, aprendendo com a vida e o mundo, não tivesse tido tempo pra isso. Harry lembra o órfão tardio daquela música “Mother”, de John Lennon, no LP de sua experiência com o “grito primal”, em 1970. Essa música de Lennon se adapta perfeitamente ao estado atual de Harry e o profundo sentimento da falta da mãe.
O funeral de Diana na abadia de Westminster foi transmitido pela televisão e assistido por 2,5 bilhões de pessoas all over the world. No dia do funeral eu estava com amigos na varanda da sede de uma fazenda no pantanal mato-grossense, olhos vidrados na telinha. Ali, com pantaneiros, sertanejos e a fazendeira, a TV ligada na transmissão pela Globo, assistimos à cerimônia. A generosa fazendeira botara a televisão na varanda pra que o povo da fazenda, sentado na mureta, assistisse à pesarosa despedida da princesa do século. E foi assim, praticamente no fim do mundo, lá pras bandas de Corumbá, que também assistimos à transmissão das honras funerárias à princesa Diana. Tempos depois, no filme em que Helen Mirren interpreta a rainha Elizabeth 2ª, na cena em que a rainha e o príncipe Philip estão na cama, no retiro de férias lá em Balmoral, na Escócia, quando o primeiro-ministro Tony Blair ao telefone cobrava insistentemente a presença do casal na cerimônia funérea em Londres. Mas o príncipe Philip dizia que não ia, porque iam estar “todos aqueles gays” amigos da morta. De fato, a presença de Elton John já estava confirmada, disso príncipe consorte tivera notícia.
Na cerimônia na catedral, ao piano emocionado, Elton John cantou a versão da letra reescrita para a ocasião. Para homenagear a princesa morta, Elton mudou alguns versos da canção “Goodbye Norma Jean”, composta por ele 25 anos antes, quando, em plena onda nostálgica, com essa música homenageara Marilyn Monroe. Para Elton John e os gays, em termos de destinos trágicos, a Diana dos 90 era comparável a Marilyn dos 60. Daí que o príncipe Philip convenceu a rainha e esposa de não irem à cerimônia. Afinal, estavam de férias.
Mês passado, aos 96 anos, o príncipe Philip anunciou que abandonaria a vida pública agora em junho. Mas a rainha, 91, não deu sinal de querer se aposentar. Com isso ela prova que, dos sexos, o feminino é o mais resistente. Casadas, viúvas, divorciadas, solteiras, amantes, indubitavelmente as mulheres do nosso tempo têm mais gás vital que os homens. Mas, e Diana, a “princesa do povo”, que no curto tempo de vida foi mulher participante e de opinião, se viva fosse, qual seria sua posição ante o impasse do Brexit?