Coluna de Antonio Delfim Netto

1. Um dos fatos mais extraordinários no processo eleitoral em andamento é que nenhum dos candidatos ousa falar uma palavra sobre a mais grave injustiça que corrói a sociedade brasileira: a abissal diferença entre os “direitos” à aposentadoria dos servidores públicos e dos trabalhadores do setor privado. Todos sabem que o atual sistema é insustentável e que as dificuldades de seu financiamento vão crescer à medida que a revolução demográfica que estamos vivendo for se completando. O Brasil está ficando velho antes de ter ficado rico. A partir de 2030/40 nossa população começará a diminuir com a redução das pessoas até 14 anos de idade e um aumento rápido daqueles com mais de 65.

2. Isso exige que os que podem e desejam trabalhar (os cidadãos, homens e mulheres, hígidos, entre 15 e 65 anos de idade) deverão produzir um “excedente” para reduzir a desigualdade de oportunidades dos nascidos em lares menos capacitados (proteção à maternidade, saúde, educação, etc.) e dar conforto aos que já ajudaram a construir o país, os aposentados. Esse terá de ser resultado de uma política de aumento da produtividade do setor privado com investimentos e inovações apoiados num Estado indutor inteligente e eficiente. Nada disso acontecerá por acaso. Deve ser a preocupação do próximo governo.

3. Mas afinal qual é a abissal diferença? Apenas a seguinte (expressa em valores arredondados em Reais de 2009):

1.valor mensal médio da aposentadoria INSS …… 900 Reais

2.idem do poder Executivo ……………………….. 4.500 Reais

3.idem do poder Judiciário ……………………….. 15.000 Reais

4.idem do poder Legislativo ……………………… 16.000 Reais

4. No ano de 2009 o déficit (quer dizer a diferença entre arrecadação e dispêndio) da previdência pública foi de 47 bilhões de Reais e o da privada de 43 bilhões, ambos financiados pelo Tesouro Nacional: 90 bilhões de Reais, ou 0,3% do PIB, mais de 6 vezes todo o dispêndio anual com a bolsa família! Como foi repartido esse subsídio aparentemente igual para o setor privado e o público?

5. O do setor público foi distribuído a 900 mil aposentados e pensionistas. O do setor privado repartido entre 27 milhões. Grosseiramente, o subsídio anual foi da ordem de: – 52.200 Reais para cada participante público e de – 1.600 Reais para cada participante privado

6. De onde vieram esses recursos? Dos impostos que o Estado recolheu. No Brasil o sistema é altamente regressivo: quem ganha menos paga mais! Logo, boa parte dos subsídios que os pobres receberam foi extraída deles mesmos! Trata-se, ou não, do maior escândalo redistributivo feito sob os olhos complacentes dos Governos que desde 1984 são controlados pela burocracia brasiliense?

Por Antonio Delfim Netto

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