Ator apenas “nas horas vagas”, Antonio Calloni se diz especialista mesmo em anzóis e nos bons vinhos. E quem sabe no realismo mágico dos escritores latino-americanos, como Gabriel García Márquez, que adora. Ainda bem que ele tem muitas horas vagas, e segue estrelando novela, minissérie, teatro, cinema…
por dado abreu fotos maurício nahas
Antonio Calloni carrega a experiência de mais de 40 anos de carreira, dezenas de novelas, personagens marcantes, filmes, séries e outras tantas peças de teatro. No entanto, sua ocupação não é dramaturgia. Nunca foi. “Sou ator apenas nas horas vagas. Na verdade me considero pescador e enófilo. São as duas coisas que eu conheço de verdade, o resto eu chuto”, brinca.
Dias após filmar a morte de seu personagem em ‘O Sétimo Guardião’, novela das 9 da TV Globo, Calloni esteve em São Paulo posando para as lentes de PODER. De sobretudo Burberry, guardava consigo o segredo de Egídio, papel vivido na trama de Aguinaldo Silva que carrega pitadas de realismo fantástico – um dos trunfos para pescar o ator na hora do convite para participar do elenco.
“Eu adoro essa coisa fantasiosa. ‘Cem Anos de Solidão’ [de Gabriel García Márquez] me deixou arrepiado quando eu terminei de ler. Foi um dos únicos livros que me causou essa sensação física”, conta, indicando que a predileção quimérica também vale para as novelas. “Saramandaia [de Dias Gomes] é uma das minhas preferidas, é a síntese do realismo fantástico, brilhante. Mexe com a nossa fantasia, estimula. É uma delícia você sair um pouco da realidade. Eu mesmo não aguento ser Antonio Calloni 24 horas por dia.”
Descendente de italianos, Calloni guarda com carinho outro folhetim: ‘Terra Nostra’, que retratou a imigração italiana no Brasil no fim do século 19. Por uma questão pessoal, a trama de Benedito Ruy Barbosa tornou-se extremamente marcante para o ator. “Aconteceu uma coisa maluca”, lembra. “Estávamos gravando no Memorial do Imigrante, em Santos, onde milhares de italianos desembarcaram no passado, e durante uma pausa eu resolvi fuçar os arquivos digitais.” Na ocasião, Calloni, que interpretou Bartolo na novela, encontrou registros oficiais da chegada de seu bisavô paterno, Attilio Calloni, em 1885, vindo de Gênova. “Fiquei muito emocionado. Eu estava caracterizado, de figurino, provavelmente vestido de uma forma muito semelhante ao modo como ele chegou naquele lugar.” A cena visceral gravada minutos depois da descoberta tornou-se inesquecível em sua carreira.
E certamente o ano de 2018 também será inesquecível. Além de viver o guardião-mor da fictícia Serro Azul em ‘O Sétimo Guardião’, Antonio Calloni voltou à maquina para escrever mais um romance – que possivelmente será editado em 2019, com orelha de Geraldo Carneiro e nome provisório de ‘Filho da Noite’ – e interpretou na série ‘Assédio’ o ex-médico Roger Abdelmassih – condenado em 2010 a 278 anos de prisão por estupro contra 39 mulheres. Questionado sobre o processo de imersão para viver um personagem tão complexo, contou a PODER ser movido sempre pelos mesmos sentimentos, seja mocinho ou bandido. “Tenho que sentir prazer e alegria no que faço, esse é o meu ideal”, conta. “No caso do Roger, costumo dizer: nada que é humano me causa estranheza. Por isso eu fui abrindo as minhas gavetas como a pintura do Salvador Dalí [Girafa em Chamas, de 1937]. Tirei um pouquinho de perversão, que está dentro de mim, mexi em outra gaveta e tirei maldade. E outras emoções inerentes a qualquer ser humano. Temos todas as possibilidades dentro de nós, mas escolhi ser um cara legal”, explicou, antes de finalizar a pensata com um sorrisão e um conselho. “Ser bom é mais fácil e prazeroso. Seja bom, nem que seja por preguiça. É mais fácil.”