Lohengrin na ópera Bastille

Foto: Reprodução/OP/Chales Duprat

Para compreender Lohengrin na nova versão de Kirill Serebrennikov na Opéra Bastille, é preciso lembrar seu filme “Leto”, dedicado à juventude dos dândis do rock russo. Essas sequências, construídas como fantasias deliberadas em preto e branco granulado, antecipam a abordagem estilística do diretor russo ao transformar a última ópera romântica de Richard Wagner em uma ópera polifrênica. Não esquizofrênica no sentido de separação, mas sim polifrênica, como na visão do romancista político especulativo Alain Damasio, que imagina uma multiplicidade de entidades colidindo em cada mente contemporânea.

Por exemplo, peguemos Elsa, a heroína e herdeira do reino, com uma mente repleta de demônios e quimeras, que Kirill Serebrennikov escolheu fazer interpretar por três atrizes que cantam e dançam simultaneamente. São essas tensões imaginadas pelo dramaturgo e músico Daniil Orlov, que reescreveu completamente o libreto de Richard Wagner, que inspiram Kirill Serebrennikov.

Transposta da corte de Brabante para a mente caótica de Elsa, depois para um hospital psiquiátrico e, finalmente, para as linhas de frente, a ação é dividida no palco em células que lembram a grade modernista. Isso permite que cantores, dançarinos e vídeos coexistam em planos sobrepostos, tudo no preto e branco expressionista favorecido pelo diretor.

Kirill Serebrennikov utiliza essas visões de guerra e terror barroco, onde os cavaleiros são adornados com capacetes no estilo Daft Punk e o pódio do rei é um tripé de luz gigante como os usados para selfies, para avançar com a trama. Elsa (soprano Johanni van Ootrum), tendo perdido seu irmão na guerra, é acusada de fratricídio por Fréderic (barítono Wolfgang Koch), manipulado por sua esposa Ortrud (soprano Nina Stemme) para mantê-la longe do poder. A heroína será salva por Lohengrin (tenor Piotr Beczala), mas ele só pode ficar com ela se sua identidade permanecer oculta, algo que Elsa se mostra incapaz de fazer.

Da narrativa de Wagner, Kirill Serebrennikov, retém apenas a essência para destacar os horrores da guerra. Os temas onipresentes da morte e da loucura nos jogos de poder, retratados por atores com vozes impecáveis, graças a um coro excepcional e à direção musical perfeita de Alexander Soddy, são transpostos para o palco da Opéra Bastille. O tema pode parecer exagerado, mas reflete o poder dos conflitos, tanto os atuais, já que Kirill Serebrennikov, banido na Rússia, agora vive em Berlim, quanto os do passado, considerando que Lohengrin foi escrito durante um período de paixões revolucionárias que levaram Richard Wagner ao exílio.

Fotos: Reprodução/OP/Chales Duprat

Lohengrin de Richard Wagner

Dirigido por Kirill Serebrennikov

Opéra National de Paris – Bastille

Até 27 de outubro de 2023

 

 

 

 

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