Julia Xavier está de volta: Nossa escrita é nossa marca no mundo

Foto: Divulgação/Editora Rocco

Sempre quando falo que não estou inspirada para escrever alguém me pergunta: “Já pensou em escrever sobre não saber o que escrever?”. Eu sempre me pergunto de volta: será que dá pra sair algo legal disso?

Escutei uma frase esses dias em um contexto completamente diferente que talvez sirva aqui: “Ju, você é uma pessoa que busca muito por respostas. Talvez você precise sustentar as perguntas”.

Essa frase ressoou tanto na minha mente, que fui tomar café com uma amiga e contei pra ela. Essa amiga é daquelas que olha pra vida de um jeito mágico e prontamente teve algo para me dizer. Ela contou sobre a obra “Uma aprendizagem ou livro dos prazeres”, de Clarice Lispector, na qual a personagem vive uma paixão e decide muitas vezes simplesmente sentir, simplesmente ser, descobrindo que o silêncio e a sensação de gostar de alguém talvez bastem.

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Ela falou sobre o livro, claro, tentando fazer esse paralelo com o “sustentar as perguntas” que eu havia escutado. Quando fui pesquisar um pouco mais sobre a obra, descobri que deve ser daqueles livros que a gente guarda pra sempre. Li algumas passagens que fizeram tanto sentido quanto o breve resumo que minha amiga já havia feito.

Uma delas, em especial, me tocou: “E era bom. ‘Não entender’ era tão vasto que ultrapassava qualquer entender – entender era sempre limitado. Mas não entender não tinha fronteiras e levava ao infinito, ao Deus. Não era um não entender como um simples de espírito. O bom era ter uma inteligência e não entender.”

Me tocou – e deve ter te tocado também – porque tenho essa insistência em precisar de respostas, precisar saber o que escrever, precisar saber o que ainda vai ser. Mas a questão, muitas vezes, é que o que vai ser ainda nem é. Faz sentido? A ansiedade que faz com que a gente cobre esse eterno “saber” acaba nos impedindo de viver o que está sendo agora.

Inclusive, você, (possível) leitor assíduo da minha coluna, pode estar se perguntando por que fazia tanto tempo que não lia algo de minha autoria. Acontece que eu estava tentando abraçar o mundo, e, sem sucesso, descobri que é muito mais fácil a gente se deixar ser abraçado por ele.

Descobri que nem que eu quisesse daria para prever o que está por vir. Então, mesmo imersa nesse não saber, decidi pôr um fim nesse hiato da escrita para voltar a dividir meus pensamentos aqui.

Viver. Sentir. Ser. Curtir. É o que eu desejo pra mim e pra você. Mais presença, e, quem sabe, mais dúvidas.

Clarice Lispector ainda diz que “a coragem de Lóri é a de, não se conhecendo, no entanto prosseguir, e agir sem se conhecer exige coragem.”

Eu comecei esse texto pensando em quão poderosa pode ser nossa escrita. Quantas vezes a utilizamos para nos declarar a alguém, para expressar o que sentimos, para dar uma notícia ruim, para se inscrever em um processo importante.

Parti de uma conclusão: nossa escrita é nossa marca no mundo. E, às vezes, ela só precisa ser. Nem sempre a gente precisa saber o que vai sair dela. Como Guimarães Rosa disse, “a vida é feita de poucas certezas e muitos dar-se um jeito”.

Que tenhamos mais coragem para escrever os nossos textos sem temas pré-definidos, o resto a gente dá um jeito.

Foto: Reprodução

 

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