Os roubos de mercadorias de luxo nas proximidades do Aeroporto Charles de Gaulle, em Paris, têm se tornado um problema crescente à medida que as quadrilhas especializadas se adaptam rapidamente aos novos sistemas de segurança. O mais recente, envolvendo o roubo de 50 peças da Balmain destinadas à Paris Fashion Week, evidencia não apenas a audácia desses criminosos, mas também a complexidade da rede logística que facilita tais crimes. Tamanha que fez Olivier Rousteing, diretor criativo da maison, ir ao X no domingo passado (17) para denunciar a vulnerabilidade do setor.
No entanto, o problema se estende além desse caso isolado. Em 30 de junho, um caminhão carregando cerca de 100 handbags da Hermès e outras 300 da Louis Vuitton foi saqueado em Tremblay-en-France, no mesmo subúrbio ao norte da capital da França que presenciou o roubo da Balmain. Na maioria das vezes, esses incidentes permanecem ocultos ao público, com seguradoras compensando discretamente as casas de luxo a fim de mantê-los assim.
As gangues operam com informações privilegiadas, explorando a longa cadeia de subcontratação do segmento – desde os remetentes até os agentes de encaminhamento e, finalmente, os destinatários. A variabilidade sazonal do frete de luxo também representa um risco, com a contratação de trabalhadores temporários, que podem, inadvertidamente, se tornar uma fonte de informação para essas quadrilhas.
E como agem esses criminosos? Geralmente, as cargas mais valiosas são interceptadas por falsos policiais ou agentes aduaneiros. Conscientes do rastreamento por GPS, os ladrões desacoplam os contêineres dos caminhões, em seguida redistribuindo a carga entre vários outros veículos, minimizando riscos e evitando possíveis rastreadores. Em geral, as ações levam poucos minutos. A escala do problema é alarmante. Uma pesquisa global da empresa britânica de logística de segurança Communications Specialist feita com executivos de varejo de luxo revelou que 62% esperavam um aumento nas perdas por roubo nos próximos três anos.
Os gatilhos para esse aumento de criminalidade variam, mas a inflação em alta e o estado atual da economia mundial certamente desempenham um papel. Em uma conjuntura como a atual, em que a disparidade de riqueza está cada vez mais evidente e a indústria de bens de luxo continua a crescer, essa roubalheira seletiva pode ser vista como um sintoma de tensões mais profundas na sociedade.
Para o CEO da Nordstrom, Erik Nordstrom, os prejuízos causados por essa disparada de pilhagens permanece dentro das previsões da empresa, como ele disse recentemente em entrevista para a Bloomberg. Contudo, em um cenário mais amplo, organizações criminosas estão saqueando bilhões em mercadorias caras para revenda ilegal, com preços que as tornam mais acessíveis. Somente nos Estados Unidos, o crime organizado no varejo resultou em uma perda de US$ 125,7 bilhões (R$ 619,7 bilhões) em atividades econômicas e custou ainda perto de 659 mil empregos em 2022, conforme dados públicos da Câmara Americana de Comércio.
Nesse panorama o conceito do “quiet luxury” não parece uma mera coincidência. Emerge em forma de resposta ponderada ao que se passa por trás das cortinas dos palcos da alta moda e do consumo exorbitante, que tem numa imagem lustrada uma de suas matérias-primas. Nele o silêncio soa como uma sutil e elegante expressão à moda de ostentação, que já não tem mais o mesmo valor. E como a tendência da hora é o real significado da exclusividade, e que aqui reside em ser discreto, em saber mais e, paradoxalmente, em mostrar menos o que pode causar cobiça naqueles que ainda seguem modismos de temporadas anteriores. Uma lição que o mundo do luxo começa a compreender aos poucos.