Fiel moradora de casas, Dulce Horta soube escolher bem seu primeiro apartamento. Há um ano, ela se instalou no charmoso edifício Lausanne, um conjunto de dois prédios grudados, de 1958, com projeto do arquiteto Adolf Franz Heep. A fachada de janelas revestidas com lâminas quebrasol coloridas é um dos ícones do bairro de Higienópolis. E uma pintura de Clóvis Graciano, que se estende por todo o hall de entrada, dá boas-vindas a quem chega.
Já no apartamento, as visitas são recebidas pelo espertíssimo Scotch, de 10 anos, da raça bedlington terrier. O lar de Dulce é um convite ao aconchego, com salas conectadas à varanda e à cozinha, e algumas pequenas coleções de objetos sentimentais, entre eles tigelas, banquetas, bengalas, livros e discos. Um cavalinho de balanço do artista Keith Haring, que era de seu filho quando pequeno, um quadro com pichação de Walter Silveira do fim dos anos 1970 e cadeiras de Paulo Mendes da Rocha compõem a atmosfera afetiva. “Tenho uma coisa de cada lugar, de cada casa, aí lembro do todo”, conta.
É nesse ambiente, e ao lado do inseparável mascote, que ela cria os pijamas da sua marca, Early Bird Just For Dreamers. “Sempre desenhei, quem desenha consegue colocar equilíbrio e estética em qualquer coisa”, diz Dulce, que estudou artes plásticas na Faap e gravura em metal em Nova York, e comandou um estúdio de design antes de dedicar-se à etiqueta própria. “Meus pijamas não são sexy, meus clientes são. Os pijamas são bem confortáveis”, define. Suas peças, vendidas apenas por Instagram e WhatsApp, já faziam sucesso muito antes da pandemia, quando as pessoas passaram a ressignificar e a valorizar as roupas para ficar em casa. A cozinha ampla – decorada com uma toalha de mesa quadriculada que pertenceu ao tio e foi emoldurada, e um galo enorme em cima da geladeira trazido do sítio da família em Paraty – é outro espaço em que a designer e empresária gosta de criar. Mas seus pratos são triviais, avisa ela, antes de qualquer comparação com a mãe, Nina Horta, banqueteira e escritora que morreu em 2019. Luminárias assinadas por André Vainer estão por todos os ambientes, incluindo o modelo de biso que ganhou destaque em seu quarto. A parede acima da cama foi intencionalmente deixada vazia porque ali, em certo momento da manhã, são refletidas as sombras das árvores da rua.
Créditos / Paulo Freitas Créditos / Paulo Freitas Créditos / Paulo Freitas
A varanda dá de frente para a residência de dona Veridiana, aristocrata que reunia a elite política e artística do fim do século 19. Hoje, o local abriga o Iate Clube de Santos. Já pelo basculante da cozinha, se avista uma das únicas casas do estilo art nouveau que resiste em São Paulo e foi cedida à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. É, de fato, um lar com muita história para contar.