Foi em uma quinta-feira à tarde, sentado em um café paulistano, que o fotógrafo e cinegrafista brasileiro Gabriel Chaim, conhecido em todo o mundo por retratar a Guerra da Síria, atendeu ao telefonema do Glamurama. Apesar de ter apenas 37 anos, o papo era para falar sobre a sua intensa experiência de vida: desde como se tornou correspondente de guerra até família e, principalmente, os novos projetos, que não fogem ao tema central de seu trabalho, mas retratam um novo momento em sua trajetória, longe das áreas de conflitos – pelo menos por enquanto – depois de quase sete anos (2013 ao início de 2019) no front.
Com a diminuição dos ataques na Síria, depois da queda do Estado Islâmico, Gabriel agora se concentra nesta etapa profissional. No segundo semestre, estreia documentário na Globo News (ainda sem data e título definidos), em que vai mostrar como foi a operação que deu fim ao Estado Islâmico, que acompanhou de outubro de 2018 até março de 2019, sem pausa. “Será um filme intenso sobre o drama humano e os combates para retomar as cidades que o Estado Islâmico ocupava”, conta. Esse será o quarto trabalho dele para o canal.
Outra novidade confirmada será a exposição em parceria com a Zipper Galeria, em São Paulo: “Posso adiantar que vai rolar em novembro e terá um conceito inédito de vídeos e fotos, bem sensorial”, revela. Em mais uma das empreitadas, Chaim vai dividir sua história em palestra, nesta sexta-feira, no Nordic Media Festival, maior conferência de mídia da região nórdica, em Bergen, na Noruega.
Por aí…
Ficar parado não é a onda de Gabriel. Em 2012, ainda estudante de Gastronomia, viajou para Dubai fotografar pratos em restaurantes chiques de lá, quando conheceu a história dos refugiados e se envolveu nessa missão. Em 2013, foi para a Síria onde começou a fazer fotos e vídeos dos conflitos, que o tornaram um profissional conhecido no mundo com colaborações em projetos com a “CNN”, “Spiegel TV”, Grupo Globo e até nos shows da banda U2, em que os registros do brasileiro, feitos com drones, eram mostrados em telões e davam uma dimensão ainda não vista sobre a guerra.
Situações difíceis não faltaram ao longo de suas coberturas. Tiroteios e mais tiroteios, amigos baleados na sua frente, balas passando a 30 centímetros de sua cabeça e circunstâncias que para nós parecem inimagináveis fizeram – e provavelmente ainda vão fazer – parte da rotina dele. Mas, o fotógrafo conta que a foto de Malika Seif, que aos nove anos pesava apenas 2,5 kg, registrada em um campo de refugiados no Iêmen, foi sem dúvida um de seus piores momentos. A garota não resistiu. Diante de tudo o que viu, fazer uma comparação entre guerras declaradas e ‘não declaradas’, não fazem sentindo para ele. “Não tem como comparar. Apesar dos conflitos que existem aqui no Brasil, por exemplo, eu ainda tenho a liberdade de sentar em um café e bater um papo com você. Em uma guerra, tudo acaba, não se pode absolutamente nada”. Isso ao deixar claro que o nosso país também está longe de viver em paz e que por aqui as questões a serem resolvidas são sociais.
Gabriel ainda voltará para a Síria este ano e tem plano de fotografar o Afeganistão para mostrar como anda a situação no país castigado por tantos enfrentamentos ao longo de sua história. Outra parada é o Iêmen, que também sofre com a guerra. Aposentadoria? “Um dia eu paro ou morro, de todo jeito”, relativiza.
Papai, mamãe, filhinhos…
As redes sociais de Gabriel dão uma dimensão do horror das guerras retratadas por ele e mostram uma certa beleza no olhar de quem é afetado diretamente por esses conflitos e que consegue manter a esperança em dias melhores. “É uma opção, não posto absolutamente nada da minha família”, diz. Gabriel é pai de uma menina de 10 anos e um menino de quatro e conta que todos já estão acostumados com o seu trabalho: “Minha filha, por exemplo, conversa sobre a situação dos refugiados, sabe o que eu faço, tem essa consciência, algo que nunca imaginei nessa idade”. E quando está lá, no front, uma das lembranças que o traz de volta é o cheiro do feijão de sua mãe, que é inesquecível. Quem resiste, não é mesmo? (por Fernanda Grilo)