Se tem alguém que carimbou 2018 em grande estilo é Marcelo Adnet. Em um ano marcado por todo o tipo de tensão, especialmente envolvendo questões políticas, ele chegou com seu humor e genialidade fazendo imitações impagáveis dos candidatos durante a corrida presidencial, tornando tudo mais leve e divertido – pelo menos por alguns minutos. Alguns dos imitados deram sua “benção” e riram de si mesmos, como Adnet conta ao Glamurama em papo que rolou nessa semana. O momento para tê-lo por aqui não poderia ser melhor: neste domingo, ele volta à TV com a quarta temporada de “Escolinha do Professor Raimundo”, na pele do impagável Rolando Lero, papel eternizado por Rogério Cardoso, e segue a mil com as gravações da sexta – e provavelmente última – temporada de “Tá no Ar”, prevista para estrear em janeiro de 2019. Vem com a gente!
Glamurama: O que a gente pode esperar da quarta temporada da “Escolinha do Professor Raimundo”, que estreia domingo?
Marcelo Adnet: “Essa temporada tem a mesma qualidade das outras, com a vantagem de personagens novos chegando. O que sempre rola na Escolinha é a renovação dos jogos e das brincadeiras. O legal é o fato de os atores terem acesso apenas a seu próprio texto e ao de mais ninguém, o que acaba gerando algumas surpresas na hora da gravação. É uma grande aventura onde você está sozinho, mas ao mesmo tempo jogando com todo mundo à sua volta. Conforme vamos ganhando intimidade vai ficando mais difícil para a edição tirar nossas bagunças (risos).”
Glamurama: O programa é um clássico da comédia nacional. Porque acha que esse formato persiste por tanto tempo?
Marcelo Adnet: “Porque ele tem jogo, de conhecer os personagens, os atores, e mesmo assim se surpreender ainda com aquela dinâmica.”
Glamurama: Conte-nos alguma curiosidade de bastidores. As gravações devem ser muito divertidas. Quem é que mais causa fora do ar?
Marcelo Adnet: “Muito divertidas! Marco Luque [Nerso da Capitinga] faz bolinhas de papel gigantescas, profissionais mesmo, e eu, que sento na frente dele, já tomei cada bolada… E aí comecei a revidar com força, e quando ele vinha atacar em mim eu desviava e a bola atingia Maria Clara Gueiros [Cândida]. Fabiana Karla [Dona Cacilda], que senta na primeira fila, ficava muito chateada quando tomava bolada! E a gente tacava mais ainda (risos). Lúcio Mauro Filho [Aldemar Vigário] e Otávio Muller [Baltazar da Rocha] comandam a bagunça -Otávio dá gritos, faz balburdia… Assume um papel de manter a gente vivo, animado, atento e brincando o tempo todo porque são algumas horas de gravação em uma cadeira dura – e a gente não tem mais 15 anos. Otaviano Costa canta e faz imitações no final das falas e tacamos as coisas nele (ele é chato, CDF). Marcius Melhem [Seu Boneco] já chegou a arremessar a lixeira!”
Glamurama: Essa é a temporada mais bagunceira até agora?
Marcelo Adnet: “Com certeza, os atores foram se entregando e se unindo.”
Glamurama: Como você era na escola?
Marcelo Adnet: “Fazia bagunça mas com bom senso, tranquilo. Eu era mais estudioso, tinha notas boas e tal até a oitava série, depois fui para um colégio muito difícil, o Santo Agostinho, no Leblon, um dos mais puxados do Rio. Poderia ser um cara super de exatas, mas isso não me completava, aí fui para humanas.”
Glamurama: Como estão as gravações de “Tá no Ar”?
Marcelo Adnet: “Rodamos até janeiro e cada dia é uma empreitada nova. Nesta temporada gravamos em locais bem legais, como o cenário de Montemor, uma das cidades de ‘Deus Salve o Rei’, uma cena de época, e no Teatro São Caetano, em Niterói, com uma orquestra… foi muito bonito.”
Glamurama: O que podemos esperar dessa sexta e última temporada?
Marcelo Adnet: “O martelo ainda não foi oficialmente batido, mas acreditamos que será a última. Estou muito tranquilo com relação a isso porque já fizemos seis temporadas, e é um programa que acaba ocupando boa parte do ano – começamos a escrever em março e gravamos até janeiro. São cenas curtas então é um projeto muito trabalhoso. Acho saudável mudar e pensar em novos projetos, poder respirar um pouquinho. Agora que o Marcius [Melhem] está dirigindo os projetos de humor da casa tem muita coisa nova para rolar, ele é muito competente. Se não for a última temporada também vou adorar porque acho o programa o máximo, apesar de dar esse trabalhão.”
Glamurama: E quais são seus próximos projetos?
Marcelo Adnet: “Projetos que posso adiantar são dois: um deles é um filme que termino em janeiro, que escrevi, tive participação no roteiro, estrelei e co-produzi, então posso chama-lo de meu primeiro filme. O segundo é tirar férias. Estou precisando de um tempo. Sou um cara que gosta muito de viajar, ver o mundo e me alimentar do ócio, então respirar é meu projeto. E para o ano que vem já temos a quinta temporada da ‘Escolinha’ confirmada.”
Glamurama: Fale um pouco mais sobre o filme.
Marcelo Adnet: “Ainda não tem um título definido, mas conta a história de um rapaz do subúrbio do Rio, muito humilde, casado com uma mulher evangélica fervorosa esperta e bonita interpretada pela Letícia Lima. Eles fazem uma dupla muito potente, vivem uma série de situações cômicas.”
Glamurama: Você é um dos humoristas brasileiros mais autorais. Como compara a liberdade de expressão que tem no Youtube com a da TV?
Marcelo Adnet: “Acho que são janelas diferentes, modos diferentes de fazer e pensar as coisas, e encaro essas mudanças de forma bem natural. Cada uma delas têm seus desafios. Uma coisa é falar no Youtube, outra coisa falar no Youtube sobre política e outra coisa é falar de politica com humor. Adaptações são normais. Há uma série de fatores envolvidos. Ando com muita saudade de fazer teatro. Entre 2019 e 2020 pretendo fazer algo, preciso de tempo para pensar com carinho. Adorei fazer cinema também, e o que acho legal da TV é essa flexibilidade de um programa poder ou não acabar com o fim de uma temporada, por exemplo, porque é bom mudar, inventar um novo estilo. Essa variedade é que é bom: TV, teatro, internet… fazer coisas diferentes é um jeito de se manter sempre alerta.”
Glamurama: Acho que podemos comparar o alcance de sucesso que você tem com seu humor com o de Tatá Werneck. Você gosta do “Lady Night”? O que acha dela como humorista?
Marcelo Adnet: “Acho a Tatá genial, maravilhosa. Ela tem uma loucura característica em cena que é muito interessante, muito rica e inspiradora. Uma mulher tão autoral, que veio do teatro improviso – eu fiz teatro de improviso com ela, em 2004, com a peça ‘Os Improvisados’, eu acho… Era um espetáculo em cartaz no Rio que ela me chamou para participar. Muito legal ver a Tatá nesse movimento, fazendo dramaturgia, apresentando, mas quero vê-la fazendo humor.”
Glamurama: Ela transita bastante entre novela e programas de humor. Você gostaria de diversificar suas atuações na TV também? Adnet galã, Adnet vilão… já pensou?
Marcelo Adnet: “Não, porque novelas exigem um preparo de atleta. É necessário uma dedicação e tempo que eu ainda não tive e não vejo esse tempo tão elástico para me dedicar nove meses a um projeto. Sem preconceitos, mas ainda não rolou.”
Glamurama: Poucos prêmios são direcionados à comédia, o que tem levado humoristas a criarem seus próprios prêmios. Acha que o gênero é pouco reconhecido?
Marcelo Adnet: “A comédia é fundamental, não acho que seja esquecida. É um assunto bastante complexo porque na TV brasileira há um apelo muito grande direcionado à dramaturgia e aos noticiários, e o humor acaba ficando espremido no fim da noite, quase marginalizado na programação porque é difícil mexer nisso. Quanto aos prêmios, acho legal exemplos como o Risadaria, que incentivam e homenageiam humoristas que às vezes, por um motivo ou outro, não bombaram tanto na TV ou na internet, e não teriam destaque de outra forma. A internet democratizou a comédia mas ainda é pouco, é preciso que as pessoas talentosas tenham reconhecimento.”
Glamurama: É sabido que você tem uma facilidade enorme de memorizar e aprender, por exemplo, idiomas. Você já fez programas falando a língua da Bósnia, Papiamento… Quantos idiomas fala fluentemente? Como aprende?
Marcelo Adnet: “Fluentemente só quatro – português, espanhol, inglês e papiamento. Outras línguas, como francês, italiano, croata e russo eu falo um pouquinho, entendo algumas coisas e me viro. Em russo eu escrevo o alfabeto, mas no geral sou um estudioso. Papiamento é a mais estranha delas. Meu mecanismo para aprender é a música. Espanhol e inglês até tem cinema e séries para ajudar no aprendizado, mas as demais línguas, até mesmo italiano e francês, fica mais difícil, então a música é um instrumento muito bom porque te traz gírias, formas de falar do local, além de todo um conhecimento sobre um país, o que é muito interessante. Se te perguntam se você conhece a cultura de um país e você canta uma música dele é o máximo!”
Glamurama: Por que aprendeu Papiamento?
Marcelo Adnet: “Uma vez que fui para o Caribe dei uma estudada na língua e tive uma conexão grande com ela que nem sei explicar de onde veio, se vivi lá em outras vidas… O idioma é uma mistura muito primitiva de espanhol, português, inglês, holandês e línguas africanas. É muito interessante. Dizem que eu falo com um arubano. Já participei de programa ao vivo falando com eles na língua local… é muito bom ir para um país onde eu possa me comunicar plenamente.”
Glamurama: Saiu na imprensa que você foi visto comprando aliança de noivado para Patrícia, sua namorada. Vocês vão se casar? A notícia estragou a surpresa do pedido?
Marcelo Adnet: “Então, não vou casar. O que aconteceu é que fui em uma loja de joias para comprar um anel que ela tinha pedido, mas era só um anel. Até fiquei de olho se tinha algum paparazzi, não vi ninguém, então sei que foi alguém da própria loja que contou para a imprensa que estive lá. É chato, ela [Patrícia] sofre por isso, eu sofro por vê-la sofrer, mas a gente segue em frente.”
Glamurama: A série “Tutorial dos Candidatos” trouxe uma leveza em um momento de grande tensão política e social. Quem foi o candidato mais difícil de imitar e por quê?
Marcelo Adnet: “O Haddad, porque ele é o menos caricato, então foi mais difícil de achar uma marca, mas consegui. Acaba que é um trabalho investigativo, um estudo profundo do modo de falar, dos trejeitos, até chegar em um lugar.”
Glamurama: Você recebeu algum feedback dos candidatos sobre as imitações?
Marcelo Adnet: “Sim, o Ciro [Gomes] e a Marina [Silva] repostaram os vídeos em suas redes sociais, e Marina me ligou para trocar uma ideia depois que passaram as eleições. Falou que adorou, que foi muito divertido para ela se ver. Quando atendi o telefone sem nem saber que era ela, ela já saiu falando ‘democraticameeeente’ com uma voz mais fina ainda (risos), e disse que adorou se ver nesse ‘espelho de bronze’, que deforma mas também ressalta certas características. Foi uma conversa muito republicana (risos). Sei que o Haddad também gostou, me mandaram um vídeo dele rindo enquanto assistia. Oficialmente foi isso.”
Glamurama: Você chegou a ser hostilizado em um mercadinho na Barra da Tijuca e até alvo de fake news após a divulgação dos vídeos. Você continua sendo alvo de algum tipo de perseguição?
Marcelo Adnet: “Olha, se eu ficar calado, na minha, tranquilo, e não entrar na internet, não. Mas se eu procurar meu nome no Google e redes sociais, rapidamente acho alguém me xingando. Mas tem que saber levar… fiz aquele relato no Twitter porque acho importante, não quis me fazer de vítima, nem nada. É uma situação complicada, não estou acostumado a ser ofendido na rua sem motivo. Estava carregado de compras quando um cara começou a gritar e depois veio um outro e me xingou mais ainda. Fiquei nervoso e sabia que não podia fazer nada. Coloquei as coisas no carro rapidamente e fui embora com eles lá, me ofendendo. Mas foi só. Depois do meu relato sofri uma série de ataques na internet, falaram que era mentira, que era ficção. Vi muita gente me xingando, até humoristas que eu não conhecia, pessoas com muitos seguidores, fazendo chacota da situação, mas ok, prefiro me abster disso. Agora já foi.”
Glamurama: O que você espera do governo de Jair Bolsonaro?
Marcelo Adnet: “Espero o melhor!”
Glamurama: Quem você gostaria que fosse indicado ao Ministério da Cultura do Brasil?
Marcelo Adnet: “Precisamos de alguém apaixonado pela cultura brasileira e que também entenda os novos movimentos do cenário artístico. Primeiro temos que manter vivas as histórias daqueles que construíram nossa cultura, e depois dar atenção a tudo o que está acontecendo agora em diversos movimentos – nas periferias, no teatro, no cinema alternativo… Mas para indicar um nome eu precisaria de pelo menos um mês (risos)”. (Por Julia Moura)