“O que você não tem mais que te entristece tanto?” É com essa pergunta que Biá, uma psicanalista aposentada, apaixonada por literatura, aborda a jovem jornalista Olívia pela primeira vez ao encontrá-la sentada à mesa de um sebo improvisado. A provocação inesperada, vinda de uma estranha, desencadeia uma sucessão de encontros marcados pela intimidade crescente que, aos poucos, revelam as histórias das duas protagonistas de “A Natureza da Mordida”, segundo livro da carreira de Carla Madeira, que estava esgotado há tempos e será lançado em nova edição pela Ed. Record, em novembro.
“É um romance que conta a história de uma psicanalista que se encontra com uma jornalista e dali nasce uma grande amizade”, conta Carla Madeira ao GLMRM. “Elas se encontram em um momento de extrema fragilidade das duas”, completa.
No livro, que ganhou novo projeto gráfico, a narrativa retoma o interesse da autora pelos conflitos humanos e temas como culpa e perdão, desejo e amor. “A história, que é narrada por ambas, foi meu segundo romance publicado e estava esgotado há uns dois anos, então, agora estamos relançando pela Editora Record. Muitos leitores vinham me pedindo pra relançar ele e eu já queria ter feito isso no início do ano, mas, quis mexer um pouco no livro antes disso. Nada estrutural, apenas rever algumas questões que eu achava que poderiam ficar melhor”, explica.
Com alternância entre as vozes, a força narrativa objetiva, descritiva e linear de Olívia contrapõe-se às anotações esparsas de Biá, cujos fragmentos de uma memória já falha e pouco confiável conduzem a um ponto de virada na trama. Assim, a autora nos mostra eventos que marcaram o passado de cada uma, evidenciando o paralelo entre as diferentes formas de abandono.
Como nos outros romances da autora, as personagens parecem saltar do papel para colocar o leitor diante de questões universais, entre elas a incondicionalidade do amor, a força do desejo, a culpa e o esquecimento, a memória e sua dinâmica inescrutável com o perdão. É também um livro sobre amizade, onde a narrativa singular, potente e envolvente de “A Natureza da Mordida” reafirma o talento de Carla Madeira e a coloca em lugar de destaque na literatura nacional contemporânea.
Carla, que foi a brasileira que mais vendeu livros de ficção nacional em 2021 e 2022, diz que acredita na força da literatura como uma arte essencial para nos colocar diante de outro ponto de vista, nos colocar no lugar do outro e ter a experiência da empatia.
“Tenho personagens femininos muito fortes, que acho que têm conquistado as mulheres e elas têm se mobilizado mais nos grupos de leitura, então, realmente sinto que existe uma força grande da leitura junto às mulheres.”
A autora finaliza: “Mas, essa discussão do feminino que precisa estar presente em homens e mulheres como uma energia que lida com as questões em aberto, com as questões de subjetividade, lida com uma série de questões fundamentais para todos os corpos, e nesse sentido tenho visto um crescimento entre leitores homens e mulheres”.